ANGOLANO NÃO CASA COM BRANCA?

Hoje explicam-me que para ser mesmo angolano (apesar de branco) deveria ter casado com uma angolana (entenda-se negra) e não com uma portuguesa (entenda-se branca). Fiquei assim a saber que não existem angolanas brancas nem portuguesas negras. É uma tese brilhante. Até porque a minha mulher era branca, nasceu e cresceu em Nova Lisboa (Huambo), bem perto da “Casa Branca” de Jonas Savimbi.

Por Orlando Castro

No dia 7 de Dezembro de 2023, na Casa de Angola, em Lisboa, na apresentação do meu livro “Eu e a UNITA”, William Tonet referiu-se ao autor do livro como “incolor”, dizendo que “os nossos brancos” “foram encaminhados para a Arca de Noé da retornança, no processo de transição do Acordo do Alvor”, identificando de uma forma muito objectiva a questão “racial” como sendo uma temática de grande fragilidade na construção da República. No ar ficou a pergunta: “o que é feito dos nossos brancos”?

Ao tentar escorraçar, eliminar, extinguir os angolanos da etnia branca, o MPLA cometeu (e continua a cometer, mas hoje não está só) um crime mensurável no facto de, por exemplo, Angola ainda hoje não ter atingido os índices de miscigenação e equidade social que registava em 1973/74. Escudados na razão da força, os dirigentes do MPLA mais não conseguiram do que mostrar o seu monstruoso complexo de inferioridade.

Ao contrário da tese do MPLA, que está a colher apoios práticos noutras forças políticas, a culpa não é só dos brancos portugueses de hoje que, ao contrário dos de ontem, procuram sacar tudo o que podem, começando o exemplo pelos governantes, passando pelos gestores e administradores públicos e restante casta.

A culpa também é nossa que colocamos os de ontem, muitos dos quais deixaram mesmo o cordão umbilical em Angola, ao mesmo nível dos de hoje, ou muitas vezes a um nível bem mais baixo.

É verdade que são aos milhares os portugueses africanos que agora nasceram de gestação espontânea, uma espécie de mercenários que nada têm em comum com muitos outros portugueses de outrora, esses sim africanos de nascimento, alma e coração.

Os novos descobridores vêm para Angola rica sacar tudo o que for possível e depois regressam à sua normal e tipificada forma de vida, voltando a ter a porta sempre fechada aos angolanos. Em sentido contrário vão os angolanos puros (negros).

Com a conivência consciente das autoridades do MPLA (no Poder há 50 anos), que não dos angolanos, Angola aposta tudo o que tem (lata) e o que não tem (dignidade) nos muitos mercenários que têm as portas blindadas e sempre fechadas, remetendo para as catacumbas todos aqueles que sempre tiveram a porta aberta mas que são, reconheço, cada vez menos.

A grande diferença é que os brancos europeus, os que aceleram na tentativa de chegar à cenoura na ponta da vara do MPLA, sempre consideraram (quiçá com razão) que até prova em contrário todos os estranhos (angolanos brancos) são culpados.

Já os membros da etnia branca de Angola, os que deram luz ao mundo, os que choram ao ouvir Teta Lando, Elias Dia Kimuezo, Carlos Lamartine ou os N’Gola Ritmos, entendem que até prova em contrário todos os estranhos são inocentes.

Em Angola, os brancos angolanos aprenderam a amar a diferença e com ela se multiplicaram. Aprenderam a ser solidários com o seu semelhante, fosse ele preto, castanho, amarelo ou vermelho.

Na Europa, os brancos estão a ultrapassar a desconfiança da diferença e neutralizam-na sempre que possível. Por outro lado, os angolanos ditos puros (que hostilizam veementemente a sua diáspora) aprenderam a ser individualistas mesquinhos, crucificando os angolanos (mesmo que negros) que vivem fora do país.

Com o re(in)gresso de milhares dos nossos brancos ao Portugal europeu, a situação alterou-se apenas por breves momentos. Tão breves que hoje, 50 anos depois da debandada africana, quase se contam pelos dedos de uma mão os que ainda se assumem como membros da etnia branca de Angola.

Isto é, muitos dos portugueses europeus que foram para África tornaram-se facilmente africanos. No entanto, ao re(in)gressarem às origens ressuscitaram a velha mesquinhez de um país virado para o umbigo, de um país de portas fechadas. Voltaram a ser apenas europeus. No entanto, também Portugal está hoje a dar novo rumo a uma sociedade que quer mais aberta e plural.

Nessa mesma leva regressaram muitos dos nossos brancos angolanos. Esses não re(in)gressaram em coisa alguma. Mantiveram-se fiéis às suas raízes mas, é claro, tiveram (e ainda têm) de sobreviver. Como se já não lhes bastasse a mesquinhez tuga, tiverem (continuam a ter) de enfrentar a acefalia de regimes políticos que acham que pintar riscas num burro o transforma em zebra.

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